É fato que não me agrado com
números e quisá eu a eles. No entanto, me recorro as suas exatidões para
descrever um pouco dos últimos acontecimentos.
Sentir falta da carteira, descobrir
que foi perdida, tentar dormir pensando nela, sonhar que a encontro, ter pesadelo
de não viajar, chegar mais cedo na agencia, sentir um frio na espinha, sentir
uma alivio na alma, procriar planilhas, agradecer pelo ar –condicionado, fazer
contagem regressiva, sentir saudades, fazer planejamento de viagem (sempre
falha), sentir-se amado as 6 da tarde, fazer logoff da prisão humana e sorrir.
Fiz questão de zerar não só os cronômetros
do “tomate” (sim, meu automóvel tem apelido) como também os do meu coração. Comecei
devagar, como quem quer aproveitar e se deleitar ao máximo de cada próximo segundo.
Tudo é mais divertido quando se tem companhia. Convidar um amigo pra viajar só
não é melhor que receber a confirmação da ida.
Partindo em 15 minutos. Em
segundos, deixando os medos, desejos, a saudade. Ela é forte pelo tempo, mas é
saciada na presença, mesmo que não na mesma proporção. A sensação térmica de calor foi
mais pela ansiedade e desejo de reencontro do que propriamente por
esquizofrenias climáticas.
Os primeiros 50 Km foram compartilhados
pela imaginação e também pela parceria
da amizade. Amizade. Tenham-na como companhia, sempre. É definitivamente, a
melhor construção já exercida no coração humano.
Entrada a 5 km. Estava perto, estávamos
chegando. Uma mistura de atraso e euforia simplesmente cortou os decibéis de
uma trilha sonora marcante e repetitiva. E enchi meus pulmões. Não foi o ar mais
gélido, foram minhas lembranças voltando pra dentro de mim.
Recém chegados, os sorrisos iam
me aparecendo à medida que os abraços iam me envolvendo. Eu estava feliz, de
novo, animado.
Tequila, pão-de-queijo, banho,
Valter, alegria, passaporte, alegria, banho, alegria, vocês, poeira, lelê,
abraços, poeira, lágrimas, sorrisos, abraços, poeira, musica, primos, amigos, irmão,
R$3.00 (deveras repetido), arena, alegria, sono, fome, amanhã, tequila,
gratidão, abraços. Eu estava ali, cercado do que ultimamente mais sentia falta
e do que sempre encontrarei.
Acordar sorrindo é possível,
mesmo que seus olhos não consigam se abrir direito, seu coração sabe o que ver.
Alias, é ele quem precisar enxergar o que realmente importa. Sou grato por ter
o meu. E ele, por ser o meu.
Calor, calor, calor, limão, carvão,
churrasco, cocriações, palas, família, amigo, sono, calor, calor, calor. E os
dias que eu vinha extinguindo com um X estavam se aproximando dele. Fechei os
olhos e senti. Era só o que queria, era o que eu precisava. Não me arrependi de
nada, de qualquer sorriso, de qualquer alegria. Faria de novo, e como espero
para fazer.
Dessa vez o olhar pra trás foi
alegre, já saudoso, mas alegre.
Partia para mais 60 Km, para próximo
dos criadores do meu coração. Por mais que sejam difíceis, nunca deixaram de
ser nossos. Pais. A casa muda, o sentimento não. O amor cresce à medida que a
saudade constrói degraus. Gosto dos dois, deles, da saudade, do amor.
Meus olhos encontram o de vocês e
simultaneamente os seus corações se tornam o meu. Não é a torta de frango nem
as palhaçadas herdadas do sangue. É o encontro, o durante e a partida. A
certeza da ida é a mesma da volta. Assim como os seus olhos se embaçam os meus se
limpam.
Até logo, obrigado, também te
amo, mandarei os abraços. Estrada, por do sol, ipê, lembranças, saudades.
160 km. Decrescentes, agora eles também
se tornam alegres. Voltando pra realidade. Doce, dura, sonhadora, estimulante.
Cansado, realizado. Foram-se. Os
dias passaram como todos os outros. Aprendi que somos nós os responsáveis por
todos eles, os ruins, os difíceis, os alegres e os extensos.
É engraçado como tudo muda. Da
perda ao encontro. Da poeira ao pôr-do-sol. Das lágrimas aos sorrisos. E vou seguindo.
351.7 km. Os últimos 100 metros
foram para descobrir que eu recomeço tudo amanhã. Que há um Deus que acredita
nos meus passos, que me instiga a caminhar e acreditar que tudo faz parte do
caminho e principalmente pra me mostrar que os meus olhos se fecham à medida
que meu coração se abre.
É fato que não me agradam os números. Mais por eles aprendi que a distancia é simplesmente um motivo para
dizer que eu percorri. Ainda não venci porem vivi.

